Um tribunal londrino determinou ontem que Julian Assange, fundador do WikiLeaks, seja extraditado para a Suécia, onde enfrentará acusações de abuso sexual. Seus advogados têm sete dias para apelar da decisão e informaram imediatamente que pretendem fazê-lo.
Vestindo o mesmo terno azul usado nas audiências anteriores, Assange manteve-se impassível enquanto a decisão era lida. Ele se encontra em liberdade depois de pagar fiança. Na decisão, o juiz Howard Riddle disse que as alegações de duas mulheres correspondiam a crimes passíveis de extradição e o mandado solicitando o retorno de Assange à Suécia para interrogatório era válido.
O veredicto marca uma reviravolta nos três meses de batalha travados nos tribunais britânicos e na mídia contra aquilo que Assange, sua equipe de advogados e as celebridades que o apoiam classificam como campanha conspiratória para deter o WikiLeaks e seus esforços para denunciar segredos corporativos e de Estado.
O caso tramita nos tribunais em meio às repercussões da operação de maior destaque já levada a cabo pelo grupo - a divulgação de 250 mil documentos secretos da diplomacia americana que se tornaram a base de reportagens publicadas por organizações jornalísticas de todo o mundo, incluindo o New York Times.
Aqueles que apoiam o WikiLeaks - muitos dos quais afirmam que as acusações contra Assange não passam de uma vingança por causa da divulgação dos documentos secretos - reuniram-se diante dos tribunais durante seis audiências, entoando gritos de "Nós o amamos, Julian". Assange teve a fiança inicialmente negada e foi brevemente detido após se negar a atender ao pedido de um juiz que quis saber seu endereço.
Promotores suecos afirmaram que Assange, um australiano de 39 anos, precisa voltar a Estocolmo para enfrentar acusações feitas por duas mulheres que dizem ter sido sexualmente abusadas por ele em agosto. Pela austera legislação sueca contra crimes sexuais, ele enfrenta duas acusações de moléstia sexual, uma acusação de coerção ilegal e uma acusação de estupro. As acusadoras, voluntárias do WikiLeaks, disseram que seus encontros sexuais com Assange começaram consensualmente, mas acabaram em situações de coerção. Assange disse que as acusações são "mentiras fantásticas", e ele se referiu à Suécia como "a Arábia Saudita do feminismo".
O juiz Riddle disse ontem que se houve abusos na Suécia "estes devem ser examinados e julgados pelo sistema sueco de justiça". Assange também negou as acusações do governo sueco de que teria deixado o país em setembro para não ser obrigado a se entregar à polícia; Assange diz que deixou a Suécia com permissão para fazê-lo. E denunciou o vazamento de dois documentos da polícia escocesa que traziam detalhes gráficos das acusações.
Assange e seus advogados demonstraram sua intenção de levar a luta aos tribunais superiores britânicos, e até ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos. As condições de sua fiança determinam que ele seja alvo de monitoramento eletrônico.
Durante a luta nos tribunais, muitos de seus colegas mais próximos abandonaram o WikiLeaks. Uma dúzia deles formou um site rival, chamado OpenLeaks. O Departamento de Justiça dos EUA declarou que sua conta do Twitter será usada como testemunho numa investigação que poderia levar a acusações de espionagem.
Em uma das entrevistas de Assange na Grã-Bretanha, ele se comparou ao pastor Martin Luther King Jr. Em discurso gravado e reproduzido este mês em comício realizado em Melbourne, Austrália, Assange comparou a luta do WikiLeaks à dos americanos negros pela igualdade de direitos na década de 50, à dos manifestantes que tentaram pôr fim à Guerra do Vietnã nos anos 60 e à das feministas e dos movimentos ambientalistas. "Para a geração da internet, este é nosso desafio e este é o momento de o enfrentarmos", disse.
Assange trabalha na redação de uma autobiografia, que ele afirmou valer US$ 1,7 milhão em direitos editoriais. "Não quero escrever este livro, mas preciso fazê-lo", disse em dezembro ao londrino Sunday Times, explicando que os custos do processo tinham ultrapassado a marca de US$ 300 mil. Assange disse a amigos na Grã-Bretanha ter medo de ser extraditado para os EUA se voltar para a Suécia, mas foi desmentido por um ex-amigo. "Ele tem muito medo é de ficar preso na Suécia", disse Daniel Domscheit-Berg, um dos fundadores do OpenLeaks. Na Suécia, Assange pode pegar até 4 anos de prisão.
PARA LEMBRAR
Em agosto da 2010, pouco após ter anunciado que revelaria documentos secretos sobre a guerra no Iraque, Julian Assange foi acusado de crimes sexuais por duas suecas. A Justiça do país interpreta os atos pelos quais ele responde como tipos "leves" de estupro. No fim de novembro, a Interpol acatou o pedido de prisão internacional feito pelo Judiciário sueco, para que Assange se apresentasse a uma Corte do país. Assange nega as acusações, dizendo que elas são parte de um complô para desmoralizá-lo. Depois de ser preso em Londres, no início de dezembro, ele conseguiu liberdade sob fiança.
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